quarta-feira, 14 de novembro de 2012

A Administração Direta e o Governo


No âmbito do Direito Administrativo, o Estado-Administração não se confunde com a aceção constitucional nem internacional: aqui Estado é uma pessoa coletiva pública que desempenha, sob a orientação do Governo, a atividade administrativa.
De facto, o Estado é uma pessoa coletiva pública autónoma, de fins múltiplos e variados – que não é confundível nem com os governantes que o orientam e dirigem nem com as demais entidades que compõem a Administração Pública!
A Administração do Estado é polimórfica, ou seja, dentro dela existem “outras Administrações”, pelo que somos capazes de distinguir as Administrações Direta, Indireta, Autónoma e a Independente.
A Administração Direta do Estado é a atividade exercida por órgãos e serviços integrados na própria pessoa coletiva pública Estado - este tem personalidade jurídica autónoma e reconhecida no âmbito do direito interno.
Fazem parte dos órgãos administrativos do Estado:
a.       O Governo – art. 182 CRP
b.      Os membros do Governo – art. 183 CRP
c.       Os diretores gerais, diretores de serviços e chefes de repartição
d.      Os governadores civis (que no atual Governo foram extintos!)
Importa considerar o Governo como órgão da administração central do Estado, pois que para além de órgão político, este se afigura como o órgão principal da administração central do Estado – art. 182 CRP.
A Constituição confere ao Governo vários poderes funcionais e importa realçar aqueles que relevam do ponto de vista da Administração. Assim, em termos de competência administrativa, a Constituição no seu art. 199.º atribui ao Governo três principais funções:
1.       Garantir a execução das leis
2.       Assegurar o funcionamento da Administração Pública
3.       Promover a satisfação das necessidades coletivas
Decorre daqui que o Governo, enquanto órgão superior da Administração Pública, para além de ter poderes de controlo sobre a Administração Direta do Estado, tem também poderes de superintendência em relação à Administração Indireta e poderes de tutela relativamente às Administrações Indireta e Autónoma.
Para realizar todas estas tarefas coloca-se a questão de saber como é que o Governo atua e qual a maneira como exerce a sua competência?
O Governo pode, em primeiro lugar, exercer a sua competência a título colegial, através do Conselho de Ministros – art. 200 e 201 CRP -; e, em segundo lugar, pode exercê-la a título individual, ou seja, ou pelo Ministro sectorialmente competente ou pelo Primeiro-ministro.
De notar, todavia, que a regra relativa à competência é a do exercício individual da competência governamental, pelo que a competência do Conselho de Ministros está prevista apenas pela lei.
Importa agora evidenciar uma questão fundamental: o Governo tem diversas atribuições[1] e a cada Ministro no atual Governo cabe-lhe ou mais do que uma competência[2] ou não lhe é atribuída nenhuma.
A regra é a de que na pessoa coletiva Estado, as atribuições estão por lei repartidas por Ministérios. Assim, os Ministros têm normalmente iguais competências para prosseguir diferentes atribuições.
Todavia, dado o atual panorama tal não se verifica: o XIX Governo Constitucional tem uma extensão bastante limitada o que levanta alguns problemas.
Em primeiro lugar, dada a conjuntura económico-financeira do País houve a necessidade de reduzir a extensão do Governo, através da concentração em alguns ministérios de múltiplas atribuições, o que gerou a criação de “superministérios”.
Este fenómeno de “superministérios” apresenta-se como uma fuga bastante rápida, mas pouco eficaz no controlo orçamental que está hoje tanto em debate. O resultado que se pretendeu com a junção de várias pastas, ou seja, dito de outra forma, a junção de várias atribuições num só ministério, pode levar a situações em que o próprio ministério se torne ingovernável, ignorando muitas vezes realidades importantes! Basta pensar no superministério da economia e do trabalho, no qual se juntam duas realidades diversas, mas que por contenção orçamental se encontram unidas.
Em segundo lugar, também devido ao mesmo argumento apresentado anteriormente, algumas atribuições não foram atribuídas a um ministro nem a nenhum ministério, como foi o caso da Cultura que foi renegada para um mero Secretário de Estado.
Como a pasta da cultura não tem uma atribuição em nenhum ministério, significa isto que o secretário de Estado vai poder atuar como verdadeiro ministro. Digo isto pois os secretários de Estado apenas têm competência delegada atribuída pelo ministro competente; assim, como não existe nenhum ministro competente, então ele pode atuar como um verdadeiro ministro, criando situações de entropia dentro do Governo. A regra da física aplica-se também aqui na realidade política: quanto maior a desordem de um sistema, maior a sua entropia!
Em minha opinião, deveria proceder-se não à criação de superministérios nem à descida de nível de certas pastas do Governo, mas antes à eliminação de “gordurinhas estruturais”.  Um exemplo que infelizmente se tornou paradigmático são os chamados gabinetes políticos. Estes não são mais do que um conjunto de pessoas de confiança pessoal nomeados ou pelo 1.º Ministro ou pelos vários Ministros.
Não fazendo parte da Administração Direta, porque não têm uma relação administrativa duradoura, nem do Estado, as pessoas que os integram não têm funções efetivas no campo administrativo, sendo, portanto, facilmente dispensáveis!

Catarina Pires
20591



[1] As pessoas coletivas existem para prosseguir determinados fins/interesses públicos postos por lei a cargo de um certo ente público; a estes fins dá-se o nome de atribuições. 
[2] Para as pessoas coletivas realizarem os fins atribuídos da pessoa coletiva necessitam de poderes funcionais, a que damos o nome de competências.

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