sexta-feira, 30 de novembro de 2012


O DEVER DE OBEDIÊNCIA DE UM SUBALTERNO NA RELAÇÃO HIERÁRQUICA
dever de obediência traduz-se na obrigação de o subalterno cumprir as ordens e instruções dos seus legítimos superiores hierárquicos, dadas em objecto de serviço e sob a forma legal (art. 3.º, n.º 7, do Estatuto Disciplinar).
Desta noção resultam os seguintes requisitos: (i) que a ordem ou as instruções provenham de legítimo superior hierárquico do subalterno; (ii) que sejam dadas em matéria de serviço; (iii) e que revistam a forma legalmente prescrita.
Mas se a ordem, derivando de legítimo superior do subalterno, sobre matéria de serviço e  pela forma devida, for intrinsecamente ilegal, implicando, portanto, se for acatada, a prática pelo subalterno de um acto ilegal ou mesmo ilícito,
Quid Juris?
Para responder a esta questão surgiram várias correntes.
corrente hierárquica, considera existir sempre dever de obediência, não assistindo ao subalterno o direito de interpretar ou questionar a legalidade das determinações do superior. Como defensor desta corrente temos o Prof. Marcello Caetano.
Diferentemente, a corrente legalista, defende não existe dever de obediência em relação a ordens consideradas ilegais.
Numa formulação restritiva desta última corrente, aquele dever cessa apenas se a ordem implicar a prática de um acto criminoso. Numa opiniãointermédia, o dever de obediência cessa se a ordem for patente e inequivocamente ilegal, por ser contrária à lei ou ao espírito da lei. Consequentemente, há que obedecer se houver mera divergência de entendimento ou interpretação quanto à conformidade do comando. Já numa enunciação ampliativa, advoga que não é devida a obediência à ordem ilegal, seja qual for o motivo da ilegalidade, dada a supremacia da lei sobre a hierarquia (assim, João Tello de Magalhães Collaço).
O Prof. Freitas do Amaral inclina-se para a corrente legalista – dado o princípio do Estado de Direito democrático (preâmbulo da CRP) e a submissão da Administração Pública à lei art. 266.º, n.º 2, da CRP) –, mas numa orientação moderada.
Na lei portuguesa, prevalece um sistema legalista mitigado, assim resulta dos arts. 271.º, n.ºs 2 e 3, da CRP, e 10.º do Estatuto Disciplinar de 1984.
Deste sistema decorre que em relação às ordens ou instruções emanadas do legítimo superior hierárquico, em objecto de serviço e com a forma legal há dever de obediência (arts. 271.º, n.º 2, e 3.º, n.º 7, do Estatuto).
No entanto, não há dever de obediência sempre que o cumprimento das ordens ou instruções implique a prática de qualquer crime (art. 271.º, n.º 3, da CRP) ou quando as ordens ou instruções provenham de acto nulo (art. 134.º, n.º 1, do CPA).
Há, ainda, dever de obediência em relação a todas as restantes ordens ou instruções. Contudo, se forem dadas ordens ou instruções ilegais (ilegalidade que não constitua crime nem produza nulidade), o funcionário ou agente que lhes der cumprimento só ficará excluído da responsabilidade pelas consequências da execução da ordem se antes da execução tiver reclamado ou tiver exigido a transmissão ou confirmado delas por escrito, fazendo expressão dessa menção de que considera ilegais as ordens ou instruções recebidas (art. 10.º, n.ºs 1 e 2, do Estatuto). Quando, porém, tenha sido dada uma ordem com menção de cumprimento imediato, será suficiente para a exclusão da responsabilidade de quem a cumprir que a reclamação, com a opinião sobre a ilegalidade da ordem, seja enviada logo após a execução desta (art. 10.º, n.º 4, do Estatuto).
Se o funcionário ou agente, antes de proceder à execução, tiver reclamado ou exigido a transmissão ou confirmação da ordem por escrito, duas hipóteses se podem verificar, enquanto não chega a resposta do superior hierárquico (art. 10.º, n.º 3, do Estatuto).
Numa primeira situação    se a demora na execução não causar prejuízo para o interesse público: o funcionário ou agente subalterno pode legitimamente retardar a execução até receber a resposta do superior, sem que por esse motivo incorra em desobediência.
Num quadro diferente, se a demora na execução causar prejuízo para o interesse público: o subalterno deve comunicar logo por escrito ao seu imediato superior hierárquico os termos exactos da ordem recebida e do pedido formulado, bem como a não satisfação deste, e logo a seguir executará a ordem, sem que por esse motivo possa ser responsabilizado.

Visto isto, cabe ainda analisar se o dever de obediência a uma ordem ilegal entra numa excepção ao princípio da legalidade (que impõe à Administração Pública uma acção com fundamento na lei e dentro dos limites por esta estabelecidos).

Na opinião do Prof. Paulo Otero não se trata de uma excepção ao princípio da legalidade visto o cumprimento de uma ordem ilegal resultar, neste caso, da própria lei concluindo que o que se passa é que a lei permite uma legalidade especial circunscrita ao âmbito da actividade administrativa.
O Prof. Freitas do Amaral, por sua vez, considera que o dever de obediência é uma excepção ao princípio da legalidade, mas é uma excepção que é legitimada pela própria Constituição, no seu art. 271.º, n.º 3. Isso não significa, porém, que haja uma especial legalidade interna: uma ordem ilegal, mesmo quando tenha de ser acatada, é sempre uma ordem ilegal – que responsabiliza o seu autor e, eventualmente, a própria Administração. Não parece de admitir, num Estado de Direito, a figura de uma “zona de legalidade especial constituída por todas as ordens ilegais dadas pelos superiores hierárquicos a que seja devida obediência”. Sendo preferível admitir que, por razões de eficiência administrativa, a Constituição entende dever abrir uma ou outra excepção ao princípio da legalidade, a aceitar que a generalidade das ordens ilegais e dos seus actos de execução façam parte integrante do bloco de actos legais praticados pela Administração.


Aqui fica um esquema meu sobre esta matéria que talvez possa ajudar no vosso estudo.

Mª Rita Anunciação

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