A NOVA LEI DAS FREGUESIAS
Um novo problema ou uma solução eficiente?
Ao abordar
este tema, torna-se imprescindível proceder a um esclarecimento que se pretende
sucinto e claro de matérias relativas à Administração Publica, sendo elas:
Administração Pública em sentido orgânico, a reforma administrativa, a
administração local do Estado, a Administração Autónoma e, por fim, as
autarquias locais(que compreendem, claro está, as freguesias). De referir que,
todas estas matérias estão interligadas e não obstante de este artigo se
referir às freguesias, ajudaram a compreender o que está em causa no que toca a
uma nova lei que as regule.
Relativamente
à Administração pública em sentido orgânico, importa referir que a
administração pública não é uma actividade exclusiva do Estado, embora esta
seja a principal entidade de entre as que integram a administração. No séc. XIX
a administração estava nas mãos dos municípios. Porém, hoje, a administração pública
estadual ocupa o primeiro lugar na tarefa administrativa, embora não possamos
esquecer o princípio da descentralização (por exemplo, a administração regional
e municipal). Aliás, os municípios e as autarquias são tidos como realidades
pré-existentes e não inteiramente subordinadas ao Estado, existe aquilo que é chamado
“poder local”. A administração pública tem como fim principal a realização em
termos concretos do interesse geral definido pela função política; como
objectivo, a satisfação regular e contínua do destino colectivo e tem ainda
natureza executivo, com caracter secundário e condicionado.
Ora, a lei em
questão neste artigo vem na continuação de uma reforma administrativa levada a
cabo em Portugal. Por reforma administrativa entende-se o conjunto sistemático
de providências destinadas a melhorar a Administração Pública de um dado país,
por forma a torná-la, por um lado mais eficiente na prossecução dos seus fins
e, por outro, mais coerente com os princípios que a regem. Assim, não é apenas
uma técnica ao serviço da eficiência, mas também, sobretudo, uma política posta
ao serviço do Homem.
Relativamente
à administração local do Estado, esta assenta em três ordens de elementos: a
divisão do território, os órgãos locais do Estado e os serviços locais do Estado.
Relativamente à divisão do território, esta pode ser uma divisão judicial ou
administrativa. Dentro da divisão administrativa geral podemos distinguir:
divisão administrativa para efeitos de administração local do estado e para
efeitos de administração local autárquica. Tendo em conta que as circunscrições
administrativas são zonas existentes no país para efeitos de administração
local, é importante não confundir este conceito com o de administração local
propriamente dita. A destrinça baseia-se essencialmente em dois aspectos:
enquanto a circunscrição é apenas uma porção do território que resulta de uma
certa divisão do conjunto, a autarquia local é uma pessoa colectiva, uma
entidade pública administrativa. Para além disso, as circunscrições
administrativas são parcelas do território nas quais actuam órgãos do Estado ou
nas quais se baseiam e assentam autarquias locais, enquanto as últimas são
entidades distintas com personalidade jurídica própria. Relativamente às
divisões administrativas básicas, o que aqui nos interessa é a divisão do
território para efeitos de administração local autárquica, que se divide
actualmente em freguesias e municípios.
Sabemos que o
Estado (mais propriamente o Governo)- artº 199/d CRP- tem sob a sua tutela a
Administração Autónoma. A nossa Constituição distingue, no seu artº 202, e três
grandes modalidades: a Administração directa, a estadual indirecta e a
autónoma. Mas em que consiste, afinal, a Administração autónoma do Estado? Por
esta última entende-se aquela que prossegue interesses públicos próprios das
pessoas que a constituem e por isso se dirige a si mesma, definindo com
independência a orientação das suas actividades, sem sujeição à hierarquia ou à
superintendência do Governo. Prossegue interesses públicos próprios das pessoas
que a constituem, ao contrário da administração indirecta que prossegue
interesses do Estado, ou seja, prossegue fins alheios. A administração autónoma
caracteriza-se pela sua autodeterminação pois dirige-se a si mesma, os seus
órgãos definem com independência a orientação das suas actividades. O que a
distingue das demais é também o facto de se administrar a si mesma, não devendo
obediência a ordens, directivas ou orientações do governo. São três as
entidades incumbidas da administração autónoma; as associações públicas, as
autarquias locais e as regiões autónomas. Todas elas têm em comum um substrato
humano, sendo que as primeiras são entidades de tipo associativo enquanto que
as demais são chamadas pessoas colectivas de população e território.
Debrucemo-nos,
agora sobre o respeitante às autarquias locais. A existência das autarquias
locais resulta de um imperativo constitucional (art .237 da CRP). Segundo nº 2
do mesmo artigo, as autarquias locais são “ pessoas colectivas territoriais
dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses
próprios das respectivas populações”. As autarquias locais são pessoas
colectivas distintas do Estado, embora possam por ele ser fiscalizadas,
controladas ou subsidiadas. Comportam quatro elementos essenciais, refira-se, o
território, o agregado populacional, os interesses próprios e os órgãos
representativos da população.
Relativamente
ao princípio da autonomia local, este surge como espaço livre de decisão das
autarquias sobre assuntos do seu interesse próprio, espaço esse que não pode
ser retirado, sob pena de atentar contra o princípio do estado Democrático.
Tem-se a autonomia local como uma forma de liberdade, de limitação do poder
politico, indissociável ao estado de direito democrático- como proclama a Carta
Europeia da Autonomia, ratificada por Portugal. Este princípio abrange não só
um domínio reservado à intervenção exclusiva das autarquias mas também poderes
decisórios independentes e o direito de recusar soluções impostas
unilateralmente pelo poder central.
Atentando
agora sobre a matéria respeitante às freguesias, mote deste artigo e
consequentemente a que mais releva, de notar que a C.R.P não nos dá nenhuma
definição das mesmas. Porém, podemos definir freguesia como sendo autarquias
locais que, dentro do território municipal, visam a prossecução de interesses
próprios da população residente em cada circunscrição paroquial. A criação das mesmas está regulada pela lei
n.º8/93, de 5 de Março, e só pode ser feita por lei da A.R, no seu art.º2. À
face da nossa lei, as freguesias estão sujeitas a duas ordens de classificações:
freguesias urbanas ou rurais e ainda freguesias de 1ª ordem, de 2ª ordem, de 3ª
ordem, conforme a dimensão populacional. Relativamente à matéria atribuída às
freguesias, a mesma é regulada pelo artigo 2.º da LAL e pelos artigos 253 e 254
do CA. A mesma matéria poder-se-á dividir em três planos: político, económico
e, por fim, cultural e social. Politicamente, realizam o recenseamento
eleitoral dos processos eleitorais de caracter politica e administrativo. A
nível económico, ocupam-se da administração dos seus bens ou dos bens sujeitos
à sua jurisdição, promovendo ainda obras públicas. No último plano estão
inseridas as acções de maior importância cultural popular e assistência social,
incluindo tarefas de saúde pública. De notar que, os municípios podem delegar
nas freguesias a realização de investimentos municipais financiados pelas
respectivas câmaras, na condição da aceitação dessas delegações pela junta e
ratificação da assembleia da freguesia. Refira-se, por último, que a freguesia
é composta por dois órgãos principais: a Assembleia de Freguesia (órgão
deliberativo e representativo dos habitantes) e a Junta de Freguesia (órgão
executivo).
Face
à observância do que acima foi explanado, estamos agora em posição de perguntar:
mas o que tem afinal de tão polémico esta nova lei? Quais são as suas
implicações reais no plano social e administrativo do nosso país? Antes de
mais, importa esclarecer o que a mesma vem regular. Esta lei (que teve como
ponto de partida o chamado “Documento Verde da Reforma da Administração Local”)
vem impor uma redução bastante significativa do número de freguesias e de
empresas municipais, prevendo também a revisão do modelo de financiamento e
incentivos à agregação de municípios. Essa mesma extinção seria feita com base
em três critérios: o número de habitantes, a distância da sede do concelho e a
tipologia de áreas urbanas. Tem, desta feita, quatro áreas de intervenção: o sector
empresarial local, a organização do território, a gestão municipal,
intermunicipal e o financiamento e a democracia local. Não poderemos de forma
alguma ponderar esta questão sem ter em conta o contexto na qual surgiu, em
plena crise financeira portuguesa. É que esta nova lei vem em consequência do estado
da economia portuguesa (a qual penso, nem valha a pena a qui adjectivar) e
resulta do Memorando
de Entendimento estabelecido entre o Governo Português, a Comissão Europeia, o
Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional. Como constava da
proposta de lei Nº 44/XII de Fevereiro de 2012, o objectivo principal desta
medida visa a extinção de 1.300 a 1.500 das 4.259 freguesias existentes em
território nacional. De notar ainda que esta medida vem extinguir
obrigatoriamente as freguesias com número inferior a 150 habitantes. Esta
reforma está orientada para uma melhoria do serviço público, aumentando a
eficiência e reduzindo custos, sempre considerando as especificidades locais
tais como a existência de diferentes tipologias de territórios (áreas metropolitanas,
urbanas ou rurais). Na minha opinião, e face à conjuntura económica que
enfrentamos, era já imprescindível (eu diria até obrigatório) rever o regime de
financiamento das autarquias locais. Considero, porém, que não chega reduzir
significativamente o número de freguesias, é preciso fazer acompanhar esta
medida de uma política que lhes dê escala, dimensão e novas competências,
apostando em políticas de proximidade. Penso que sobressai aqui um imperativo
de melhoramento da gestão do território e da prestação de serviço público aos
cidadãos. De notar que, quanto à gestão municipal, intermunicipal e financiamento, aposta-se na
dupla descentralização do Estado para os municípios e dos municípios para as
freguesias. Trata-se aqui de uma verdadeira reforma da administração local que
vem visar o reforço do municipalismo, promovendo a coesão e a competitividade
territorial através do poder local.
Contra o que acima
defendo, poderia argumentar-se o facto desta medida poder ser factor de perda
de identidade das regiões, bem como factor de perda de património histórico,
cultural e social. Poder-se-ia ainda dizer que há uma grande quebra com a
proximidade da Administração Central, podendo isso contribuir para uma
penalização do desenvolvimento local. Apesar de referir estes argumentos,
considero que não são suficientemente fortes para implicar a não concordância
com a lei, pelo que a mesma, se aplicada naquilo que lhe é conforme, trará
vantagens que superarão esta distanciação.
Raquel Frazão Vaz /
N.º22097 / A3
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