sábado, 8 de dezembro de 2012


A Hierarquia Administrativa com especial atenção ao dever de obediência

Nem sempre ao longo dos tempos, tem existido consenso na doutrina portuguesa sobre o modo como caracterizar a hierarquia administrativa.
O Professor Diogo Freitas do Amaral, distanciando-se das várias concepções de hierarquia utilizadas, e por ele consideradas impróprias ou sem relevância para fins de organização administrativa, como a hierarquia dos tribunais, onde não existe um vinculo de subordinação essencial, a hierarquia dos postos, que por sua vez não diz respeito a nenhuma hierarquia em sentido jurídico, ou ainda a hierarquia politica, caracteriza a hierarquia administrativa como “ o modelo de organização administrativa vertical, constituído por dois ou mais órgãos e agentes com atribuições comuns, ligados por um vinculo jurídico que confere ao superior o poder de direcção e impõe ao subalterno o dever de obediência ”.
 Faz ainda referência às duas principais modalidades de hierarquia que existem. Por um lado, a hierarquia interna, que se assume como uma hierarquia de agentes e que diz respeito ao modelo vertical de organização interna de serviços públicos que assenta na diferenciação entre superiores e subalternos. Por outro lado, a hierarquia externa, onde já não está em causa a divisão do trabalho pelos agentes, mas a repartição das competências entre aqueles em quem está confiado o poder de tomar decisões em nome da pessoa colectiva, ou seja, já não surge no âmbito do serviço público, mas sim, da pessoa colectiva pública.
Da definição atrás citada de hierarquia administrativa do Professor Diogo Feitas do Amaral, são de salientar três aspectos:
1 – Existência de um vínculo entre dois ou mais órgãos e agentes
2 – Comunidade de atribuições entre os elementos da hierarquia
3 – Vínculo jurídico constituído pelo poder de direcção e pelo dever de obediência
O dever de obediência presente neste último número apresenta-se como fundamental no âmbito da hierarquia administrativa e alvo de algumas questões que importa referir.
Segundo o artigo 3º, nº 7 do Estatuto Disciplinar, o dever de obediência consiste na “obrigação do subalterno cumprir as ordens e instruções dos seus legítimos superiores hierárquicos, dadas em objecto de serviço e sob a forma legal ”.
Posto isto, e como nos diz o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, o dever de obediência tem como pressupostos a competência do autor das ordens e instruções, a forma legalmente prescrita na lei e o seu conteúdo, tendo que versar esta sobre matérias de serviço.
Pergunta de resposta fácil é a do que acontece quando a ordem não cumpre estes requisitos, ou seja, quando respeite um assunto particular, quando emane de quem não seja legitimo superior ou quando tenho sido dada verbalmente e a lei exigia forma escrita, visto estarmos claramente perante uma ordem extrinsecamente ilegal, no entanto, muito mais complicado é a tarefa de saber se continua a existir dever de obediência quando estamos perante uma ordem, que ainda que tenha verificado estes pressupostos, seja intrinsecamente ilegal.
Para se conseguir resolver esta questão é necessário ter em conta duas teorias, uma vez que também a doutrina tem divergido a este respeito.
Em primeiro lugar, a corrente hierárquica, onde existe sempre o dever de obediência, não podendo o subalterno interpretar ou questionar a legalidade das ordens do superior. Entre nós, Marcello Caetano tendia para esta posição, ainda que de maneira temperada.
Em segundo lugar, a corrente legalista, apoiada por João Tello de Magalhães Collaço, que defendia não existir dever de obediência em relação a ordens julgadas ilegais. O Professor Marcelo Rebelo de Sousa afirma que numa versão maximalista desta teoria a obediência cede sempre perante a lei, numa versão intermédia apenas se a ilegalidade for manifesta, e por fim, numa versão minimalista, a prevalência da lei só acontece quando estejamos perante actos criminosos.
Como conclusão, referir que o Professor Diogo Freitas do Amaral é a favor da corrente legalista, bem como, que o sistema que vigora, hoje em dia, em Portugal é o sistema legalista mitigado, o que se apreende do artigo 271º, nº 2 e 3 da CRP e do artigo 10º do Estatuto Internacional de 1984, em contraste com o que acontecia antes do 25 de Abril onde estávamos perante um sistema hierárquico.  

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