Originariamente este
conceito delimitava certos comportamentos da Administração em função da
fiscalização da actividade administrava pelos tribunais, tendo, dessa
perspectiva, primeiro servido como garantia da Administração e, depois, como
garantia dos particulares.
Ainda hoje este
conceito desempenha esta importante função de delimitar comportamentos
susceptíveis de fiscalização contenciosa, designadamente através do meio
processual do recurso contencioso de anulação (art. 268º/4 CRP).
Mas, a par dela,
cumpre também uma função substantiva (a realização, num caso concreto, da
medida geral e abstractamente estabelecida na norma jurídica, vinculada ou
discricionariamente) e uma função procedimental (a Administração está perante
uma situação de facto ou de direito que lhe demanda a prática de um acto com as
características correspondentes às da noção de acto administrativo constantes
no art. 120º do CPA).
1.
Definição
do conceito: elementos e análise
O acto administrativo
é o acto jurídico unilateral praticado, no exercício do poder administrativo,
por um órgão da Administração ou por outra entidade pública ou privada para tal
habilitada por lei, e que traduz uma decisão tendente a produzir efeitos
jurídicos sobre uma situação.
Daqui podemos retirar
que os elementos deste conceito são:
a.
Um
acto jurídico
Ou seja, é uma
conduta voluntária produtora de efeitos jurídicos. Ficam, assim, excluídos do
conceito os factos jurídicos involuntários ou naturais, as operações materiais
e as actividades juridicamente irrelevantes – nenhuma destas categorias pode,
assim, ser susceptível de recurso contencioso nem está sujeita ao regime
procedimental e substantivo que figura na no CPA, salvo no que respeita às
operações materiais, que devem conformar-se com os princípios e normas daquele
diploma que concretizam preceitos constitucionais (art. 2º/5 CPA).
b.
Um acto unilateral
Ou seja, provém de um
autor cuja declaração é perfeita independentemente do concurso de vontades de
outros sujeitos. Não se confunde, assim, o acto administrativo com o contrato
administrativo.
O acto de nomeação de
um funcionário público é um acto unilateral, fica válido pela declaração de
vontade da Administração Pública, no entanto a aceitação do interessado é um
requisito de eficácia.
Ficam, assim, fora do
conceito de acto administrativo, todos os actos bilaterais da Administração e,
nomeadamente, todos os contratos por ela celebrados.
c.
Um acto de um órgão administrativo
O acto administrativo
deve ser praticado no exercício do poder administrativo, isto é, ao abrigo de
normas de direito público.
Daqui resulta que não
são actos administrativos os actos jurídicos praticados pela Administração
Pública no desempenho de actividades de gestão privada nem os actos políticos,
legislativos e jurisdicionais.
d.
Um acto materialmente administrativo
Significa que é um
acto praticado ou por um órgão da Administração Pública em sentido orgânico ou
por um órgão de uma pessoa colectiva privada, ou por um órgão do Estado não
integrado no poder executivo, por lei habilitados a praticar actos administrativos.
Note-se, no entanto,
que não é qualquer funcionário público ou agente administrativo que pode
praticar actos administrativos. Os indivíduos que por lei ou delegação de
poderes têm aptidão para praticar actos administrativos são órgãos da Administração;
as nossas leis denominam-nos também autoridades administrativas.
Assim, são
administrativos certos actos praticados por órgãos de pessoas colectivas que
não se integram na Administração Pública em sentido orgânico – determinadas
pessoas colectivas privadas colaboram intimamente com a Administração Pública
na prossecução de atribuições desta, por força disso, a lei atribui-lhes
competência para praticarem actos administrativos (art. 51º c) e d) ETAF e
artigos 2º e 4º do CPA).
Por outro lado, são
também administrativos certos actos jurídico-públicos praticados por órgãos do
Estado não pertencentes ao poder executivo, ou seja, órgãos integrados no poder
moderador, no poder legislativo ou no poder judicial (art. 26º/1 b), c) e d)
ETAF).
Não são actos administrativos,
por não provirem de um órgão da Administração Pública ou de um órgão legalmente
habilitado a praticar actos administrativos, os actos praticados por indivíduos
estranhos à Administração Pública. Neste caso, se um indivíduo sem qualquer
vínculo com a Administração se faz passar por órgão desta e pretende praticar
actos administrativos, decorrem daí três consequências: tais actos são
inexistentes, é cometido o crime de usurpação de funções, e é constituída
responsabilidade civil.
e.
Um acto decisório
O acto administrativo
é uma decisão proveniente de um órgão administrativo. Isto implica que nem
todos os actos jurídicos privados praticados no exercício de um poder
administrativo e que visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual
e concreta são actos administrativos, só o sendo os que corresponderem a um
conceito estrito de decisão, quer dizer, a uma estatuição ou determinação sobre
uma certa situação jurídico-administrativa. A expressão decisão corresponde aos
significados de estatuição, determinação e prescrição.
Só tem sentido submeter
aos regimes procedimentais e substantivo do acto administrativo do CPA,
condutas administrativas susceptíveis de definir a esfera jurídica dos
particulares.
Exclui-se, assim, do
conceito de acto administrativo, vários actos jurídicos da Administração como
os actos preparatórios – chamar alguém ao procedimento para se pronunciar, optar
por ouvir peritos, etc.
f.
Um acto que versa sobre uma situação individual e
concreta.
Este último elemento
visa estabelecer a distinção entre os actos administrativos, que têm conteúdo
individual e concreto, e as normas jurídicas emanadas da Administração Pública,
os regulamentos, que têm conteúdo geral e abstracto. Ficam, assim fora do
conceito de acto administrativo os actos legislativos e os regulamentos.
Há, ainda, que falar
aqui dos actos colectivos, dos actos plurais e dos actos gerais.
Os actos colectivos
são os que têm por destinatário um conjunto unificado de pessoas. Os
destinatários do acto, aqui, são os membros do órgão colegial e não a
instituição. Em rigor o que na realidade existe na ordem jurídica são tantos
actos quantas as pessoas abrangidas pela dissolução.
Vêm, depois, os actos
plurais. Estes são aqueles em que a Administração Pública toma uma decisão
aplicável por igual a várias pessoas diferentes.
Em terceiro lugar,
vêm os actos gerais, estes são aqueles que se aplicam de imediato a um grupo
inorgânico de cidadãos, todos bem determinados, ou determináveis no local.
Estes actos gerais não são normas jurídicas, são ordens concretas, dadas a
pessoas concretas dadas a pessoas concretas e bem determinadas – são um feixe
de actos administrativos, que se reportam a verias situações individuais e
concretas.
2.
Natureza
jurídica do acto administrativo
A estrutura do acto
administrativo compõe-se em quatro ordens de elementos:
a.
Elementos subjectivos
O acto administrativo
típico põe em relação dois sujeitos de direito: a Administração Pública e um
particular ou, em alguns casos, duas pessoas colectivas públicas (autorizações
ou aprovações tutelares, por exemplo) ou duas pessoas colectivas privadas (acto
de rescisão por motivo de interesse público de um contrato de cessão de
exploração de um restaurante situado numa ara de serviço de uma auto-estrada
por um concessionário de obras públicas, por exemplo).
Existem, no entanto,
várias excepções a esta regra, como é o caso dos actos administrativos
multipolares, direccionados erga omnes, com eficácia em relação a
terceiros.(exemplo: classificação de um bem como sendo do domínio público).
Assim, um dos
sujeitos que o acto relaciona é uma pessoa colectiva pública que integra a
Administração ou, por vezes, uma pessoa colectiva privada titular de poderes de
autoridade que com ela colabora.
b.
Elementos formais
Todo o acto
administrativo tem sempre necessariamente uma “forma”, isto é, um modo pelo
qual se exterioriza ou manifesta a conduta voluntária em que o acto consiste.
Não se deve, no entanto, confundir a forma do acto administrativo com a forma
dos documentos em que se contenha a redução a escrito de actos administrativos
(decreto, portaria, despacho, etc.).
Além da forma do acto
administrativo, há, ainda, a assinalar as formalidades prescritas pela lei para
serem observadas na fase de preparação da decisão ou na própria fase da decisão.
São todos os trâmites que a lei manda observar com vista a garantir a correcta
formação da decisão administrativa, bem como o respeito pelos direitos
subjectivos e interesses legítimos dos particulares.
As formalidades, ao
contrário da forma, não fazem parte do acto administrativo, em si mesmo
considerado. No entanto, a lei apenas permite aos particulares atacar
contenciosamente a inobservância de formalidades através da impugnação do acto
administrativo a que elas respeitem, por isso, tudo se passa na prática como se
as formalidades fizessem parte do próprio acto.
c.
Elementos objectivos
São o conteúdo e o
objecto.
O conteúdo é a
substância da conduta voluntária em que o acto consiste. Fazem parte do
conteúdo do acto administrativo: a decisão essencial tomada pela Administração,
as cláusulas acessórias e os fundamentos da decisão tomada.
O objecto do acto
administrativo consiste na realidade exterior sobre que o acto incide (uma
pessoa, uma coisa ou um acto administrativo primário).
d.
Elementos funcionais
Comporta três
elementos funcionais:
–
Causa
É um elemento que tem
sido muito discutido na doutrina e sobre o qual não há consenso entre os
autores. Para o Professor DFA é a função jurídico-social de cada tipo de acto
administrativo (vertente objectiva) ou, noutra perspectiva, o motivo típico
imediato de cada acto administrativo (vertente subjectiva).
–
Motivos
São todas as razões
de agir que impelem o órgão da Administração a praticar um certo acto
administrativo ou a dotá-lo de um determinado conteúdo.
–
Fim
É o objectivo ou
finalidade a prosseguir através da prática do acto.
Dentro da estrutura
dos actos administrativos podemos, ainda, distinguir entre:
a.
Elementos
São as realidades que
integram o próprio acto, em si mesmo considerado. Dividem-se em elementos
essenciais (sem os quais o acto não existe ou não pode produzir efeitos) e
elementos acessórios (podem ou não ser introduzidos no acto).
b.
Requisitos
São as exigências que
a lei formula em relação a cada um dos elementos do acto administrativo, para
garantia da legalidade e do interesse público ou dos direitos subjectivou e dos
interesses legítimos dos particulares. Dividem-se em requisitos de validade e
requisitos de eficácia.
c.
Pressupostos
São as situações de
facto de cuja ocorrência depende a possibilidade legal de praticar um certo
acto administrativo ou de o dotar com determinado conteúdo.
Pedro Poiret Saldanha
Nº 22131
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