Francisco
Ferreira, nº 21875
1.Introdução
As funções do
Governo traduzem-se, juridicamente, na prática de actos e no desempenho de
actividades da mais diversa natureza: este elabora normas jurídicas –
regulamentos –, pratica actos jurídicos sobre casos concretos – actos
administrativos –, celebra contratos (administrativos) e exerce, de um modo
geral, determinados poderes funcionais – ex.: poderes de vigilância, de fiscalização,
de superintendência, de tutela, etc…
O Governo pode
exercer as suas competências de duas formas:
a) por forma
colegial – através do Conselho de Ministros, órgão colegial (art. 200.º da
CRP);
b) individualmente
– pelos vários membros do Governo (Primeiro-Ministro, Ministros, Secretários de
Estado, Subsecretários de Estado). Estes decidem sozinhos, nas suas atribuições, mas em nome do
Governo.
2.O
Conselho de Ministros
Cabe ao Conselho de Ministros, nos termos do art. 200.º, n.º
1, al. a), da CRP, “definir as linhas
gerais da política governamental, bem como as da sua execução”.
Podemos definir o Conselho de
Ministros como o órgão colegial constituído pela reunião de todos os Ministros
(e Vice-Primeiros-Ministros, se os houver), sob a presidência do Primeiro-Ministro,
ao qual compete desempenhar as funções políticas e administrativas que a
Constituição ou a lei atribuam colectivamente ao Governo.
A regra é o exercício individual
das competências governamentais, só actuando o Conselho de Ministro quando a
lei expressamente o preveja.
O art. 200.º, n.º 1, al. g), da
CRP, diz que “Compete ao Conselho de
Ministros (…) deliberar sobre assuntos da competência do Governo que lhe sejam
atribuídos por lei ou apresentados pelo Primeiro-Ministro ou por qualquer
Ministro”. Pergunta-se se, em face deste preceito, se deve entender que o
Conselho de Ministros pode tomar decisões de fundo sobre qualquer matéria da
competência do Primeiro-Ministro ou de algum Ministro, desde que o titular
dessa competência leve o assunto a Conselho de Ministros e aí proponha que seja
o Conselho de Ministros a resolver (ou porque tem dúvidas sobre a orientação a
seguir, ou porque pretende obter cobertura política para uma decisão
melindrosa).
O Prof. FREITAS DO AMARAL entende
que não. Seria uma subversão dos princípios gerais sobre a competência dos
órgãos administrativos que o Conselho de Ministros pudesse substituir-se ao
Primeiro-Ministro ou a qualquer Ministro para resolver assuntos da competência
própria destes, e nada permite supor que a Constituição tenha querido operar
tamanha alteração. O sentido da Constituição é outro: o Conselho de Ministros
poderá deliberar sobre a matéria, sim, mas apenas para dar uma orientação
política ao Ministro sobre o modo como ele deverá decidir e conferir-lhe
reforçada cobertura política para a decisão que vai tomar. Mas a decisão,
juridicamente, deverá ser tomada pelo Ministro competente, ou seja, pelo
Ministro que a lei considerar competente – e não pelo Conselho de Ministros em
sua substituição, ainda que o próprio Ministro o deseje ou nisso consinta. A
competência é de ordem pública: não depende nem pode resultar da vontade dos
órgãos da Administração.
3.Funções administrativas do Conselho de Ministros:
As funções administrativas
atribuídas ao Conselho de Ministros são:
a) Atribuídas pela Constituição: art.
200.º, n.º 1, als. a), e), f) e g), da CRP;
b) Conferidas pela lei: poderes de
gestão da função pública (acumulação e incompatibilidades, licenças e faltas,
vencimentos, etc…); concessão de determinados benefícios fiscais (isenção de
impostos, redução de direitos aduaneiros); aplicação de determinadas sanções
administrativas mais graves (demissão, aposentação compulsiva); apreciação de
certos recursos administrativos; etc...
As funções administrativas do
Conselho de Ministros podem ser exercidas pelo Primeiro-Ministro, ou pelos
adjuntos do Primeiro-Ministro (Ministros de Estado e Ministros sem pasta), ou
por alguns Ministros em casos especiais ou, ainda, por Conselhos de Ministros
especializados. Esta desconcentração de poderes do Conselho de Ministros
noutros órgãos pode ser feita directamente por lei, ou pode ser feita por
delegação. Porém, o objectivo é sempre o mesmo: conseguir o reforço da
eficiência da acção governativa.
4.O caso dos Conselhos de Ministros especializados (ou
restritos)
Os Conselhos de Ministros
especializados são órgãos secundários e auxiliares do Conselho de Ministros
plenário, formados por alguns membros deste, e que funcionam como secções do
Conselho de Ministros.
A existência de Conselhos de
Ministros especializados está consagrada no art.220.º, n.º 2, da CRP. Estes
podem ter uma de três funções:
1)Função preparatória: preparar
as decisões que hão-de ser tomadas pelo Conselho de Ministros. Nesta hipótese,
os Conselhos especializados actuam antes do Conselho de Ministros;
2)Função decisória: nos casos em
que essa competência lhes seja atribuída por lei ou por delegação do Conselho
de Ministros, os Conselhos especializados podem substituir-se àquele na prática
de actos administrativos ou na aprovação de regulamentos. Os Conselhos
especializados actuam em vez do Conselho de Ministros;
3)Função executiva: estudam e
deliberam acerca das formas de dar execução a deliberações que tenham sido
tomadas pelo Conselho de Ministros. Ou então de promover e acompanhar ou
controlar a respectiva execução. Os Conselhos executivos actuam depois do
Conselho de Ministros já ter decidido.
A estes Conselhos são chamados, habitualmente, não apenas os Ministros competentes, mas também os Secretários de
Estado das respectivas pastas e, até, por vezes, os altos funcionários dos
ministérios, para que se possa esclarecer os decisores.
5.A Coordenação ministerial
Há assuntos
administrativos que só podem ser resolvidos por conjugação de esforços, por
decisão conjunta de dois ou mais Ministros. Os problemas económicos, por
exemplo, precisam normalmente de um acordo entre o Ministro das Finanças e o
Ministro da Agricultura ou o Ministro da Economia, etc… São casos que exigem
uma coordenação ministerial.
Se é verdade
que o Primeiro-Ministro desempenha um papel da maior relevância na coordenação
do trabalho dos Ministros – e é o principal responsável por ele –, isso não
significa que a coordenação ministerial seja exercida apenas e sempre por ele. Há
outras modalidades de coordenação ministerial:
1 - coordenação
por acordo entre os serviços dos diferentes ministérios: há casos em que
a intervenção dos Ministros visará apenas formalizar uma decisão já preparada e
com a qual concordam; aqui, a coordenação estabelece-se ao nível dos serviços;
2 - coordenação
por comissões interministeriais: em certos casos, a coordenação entre serviços
de ministérios diferentes exige mecanismos permanentes de concertação; surgem
assim as comissões interministeriais;
3 - coordenação
por acordo entre os Ministros competentes: é frequente que não haja
acordo entre os serviços dos ministérios ou nas comissões interministeriais: os
serviços têm muitas vezes uma certa parcialidade, tendo de se recorrer aos
Ministros;
4 - coordenação
por um Vice-Primeiro-Ministro ou equivalente (Ministro de Estado,
Ministro sem pasta);
5 - coordenação
pelo Primeiro-Ministro: aqui verifica-se a intervenção formal do
Primeiro-Ministro, que tem a responsabilidade constitucional de coordenar o
Governo;
6 - coordenação
pelo Conselho de Ministros: o Primeiro-Ministro, porque assim o entende
ou porque algum Ministro lho solicita, pode levar um assunto a Conselho de
Ministros;
7 - coordenação
por Conselho de Ministros especializados: aí são levados e tratados os
assuntos de natureza predominante técnica, que não convenha ser um órgão
eminentemente político (como o Conselho de Ministros plenário) a decidir.
Porém, nenhuma destas
hipóteses se confunde com o Conselho de Ministros. Este delibera quando a lei
impõe e não só quando a matéria é complexa e os decisores competentes decidem
pedir-lhe que delibere. Tem competências próprias e pode-lhe ser pedido, para
além disso, que oriente um membro do Governo na sua decisão ou que os coordene
num processo decisório conjunto. Isto, porém, não o reduz, no que toca às suas competências administrativas, a uma forma de
coordenação ministerial, embora esse
papel também lhe possa caber.
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