domingo, 9 de dezembro de 2012

O Conselho de Ministros


Francisco Ferreira, nº 21875

1.Introdução

As funções do Governo traduzem-se, juridicamente, na prática de actos e no desempenho de actividades da mais diversa natureza: este elabora normas jurídicas – regulamentos –, pratica actos jurídicos sobre casos concretos – actos administrativos –, celebra contratos (administrativos) e exerce, de um modo geral, determinados poderes funcionais – ex.: poderes de vigilância, de fiscalização, de superintendência, de tutela, etc…

O Governo pode exercer as suas competências de duas formas:

a) por forma colegial – através do Conselho de Ministros, órgão colegial (art. 200.º da CRP);
b) individualmente – pelos vários membros do Governo (Primeiro-Ministro, Ministros, Secretários de Estado, Subsecretários de Estado). Estes decidem sozinhos, nas suas atribuições, mas em nome do Governo.


2.O Conselho de Ministros

Cabe ao Conselho de Ministros, nos termos do art. 200.º, n.º 1, al. a), da CRP, “definir as linhas gerais da política governamental, bem como as da sua execução”.
Podemos definir o Conselho de Ministros como o órgão colegial constituído pela reunião de todos os Ministros (e Vice-Primeiros-Ministros, se os houver), sob a presidência do Primeiro-Ministro, ao qual compete desempenhar as funções políticas e administrativas que a Constituição ou a lei atribuam colectivamente ao Governo.
A regra é o exercício individual das competências governamentais, só actuando o Conselho de Ministro quando a lei expressamente o preveja.

O art. 200.º, n.º 1, al. g), da CRP, diz que “Compete ao Conselho de Ministros (…) deliberar sobre assuntos da competência do Governo que lhe sejam atribuídos por lei ou apresentados pelo Primeiro-Ministro ou por qualquer Ministro”. Pergunta-se se, em face deste preceito, se deve entender que o Conselho de Ministros pode tomar decisões de fundo sobre qualquer matéria da competência do Primeiro-Ministro ou de algum Ministro, desde que o titular dessa competência leve o assunto a Conselho de Ministros e aí proponha que seja o Conselho de Ministros a resolver (ou porque tem dúvidas sobre a orientação a seguir, ou porque pretende obter cobertura política para uma decisão melindrosa).
O Prof. FREITAS DO AMARAL entende que não. Seria uma subversão dos princípios gerais sobre a competência dos órgãos administrativos que o Conselho de Ministros pudesse substituir-se ao Primeiro-Ministro ou a qualquer Ministro para resolver assuntos da competência própria destes, e nada permite supor que a Constituição tenha querido operar tamanha alteração. O sentido da Constituição é outro: o Conselho de Ministros poderá deliberar sobre a matéria, sim, mas apenas para dar uma orientação política ao Ministro sobre o modo como ele deverá decidir e conferir-lhe reforçada cobertura política para a decisão que vai tomar. Mas a decisão, juridicamente, deverá ser tomada pelo Ministro competente, ou seja, pelo Ministro que a lei considerar competente – e não pelo Conselho de Ministros em sua substituição, ainda que o próprio Ministro o deseje ou nisso consinta. A competência é de ordem pública: não depende nem pode resultar da vontade dos órgãos da Administração.


3.Funções administrativas do Conselho de Ministros:

As funções administrativas atribuídas ao Conselho de Ministros são:
a) Atribuídas pela Constituição: art. 200.º, n.º 1, als. a), e), f) e g), da CRP;
b) Conferidas pela lei: poderes de gestão da função pública (acumulação e incompatibilidades, licenças e faltas, vencimentos, etc…); concessão de determinados benefícios fiscais (isenção de impostos, redução de direitos aduaneiros); aplicação de determinadas sanções administrativas mais graves (demissão, aposentação compulsiva); apreciação de certos recursos administrativos; etc...

As funções administrativas do Conselho de Ministros podem ser exercidas pelo Primeiro-Ministro, ou pelos adjuntos do Primeiro-Ministro (Ministros de Estado e Ministros sem pasta), ou por alguns Ministros em casos especiais ou, ainda, por Conselhos de Ministros especializados. Esta desconcentração de poderes do Conselho de Ministros noutros órgãos pode ser feita directamente por lei, ou pode ser feita por delegação. Porém, o objectivo é sempre o mesmo: conseguir o reforço da eficiência da acção governativa.


4.O caso dos Conselhos de Ministros especializados (ou restritos)

Os Conselhos de Ministros especializados são órgãos secundários e auxiliares do Conselho de Ministros plenário, formados por alguns membros deste, e que funcionam como secções do Conselho de Ministros.
A existência de Conselhos de Ministros especializados está consagrada no art.220.º, n.º 2, da CRP. Estes podem ter uma de três funções:

1)Função preparatória: preparar as decisões que hão-de ser tomadas pelo Conselho de Ministros. Nesta hipótese, os Conselhos especializados actuam antes do Conselho de Ministros;

2)Função decisória: nos casos em que essa competência lhes seja atribuída por lei ou por delegação do Conselho de Ministros, os Conselhos especializados podem substituir-se àquele na prática de actos administrativos ou na aprovação de regulamentos. Os Conselhos especializados actuam em vez do Conselho de Ministros;

3)Função executiva: estudam e deliberam acerca das formas de dar execução a deliberações que tenham sido tomadas pelo Conselho de Ministros. Ou então de promover e acompanhar ou controlar a respectiva execução. Os Conselhos executivos actuam depois do Conselho de Ministros já ter decidido.

A estes Conselhos são chamados, habitualmente, não apenas os Ministros competentes, mas também os Secretários de Estado das respectivas pastas e, até, por vezes, os altos funcionários dos ministérios, para que se possa esclarecer os decisores.


5.A Coordenação ministerial

Há assuntos administrativos que só podem ser resolvidos por conjugação de esforços, por decisão conjunta de dois ou mais Ministros. Os problemas económicos, por exemplo, precisam normalmente de um acordo entre o Ministro das Finanças e o Ministro da Agricultura ou o Ministro da Economia, etc… São casos que exigem uma coordenação ministerial.
Se é verdade que o Primeiro-Ministro desempenha um papel da maior relevância na coordenação do trabalho dos Ministros – e é o principal responsável por ele –, isso não significa que a coordenação ministerial seja exercida apenas e sempre por ele. Há outras modalidades de coordenação ministerial:
1 - coordenação por acordo entre os serviços dos diferentes ministérios: há casos em que a intervenção dos Ministros visará apenas formalizar uma decisão já preparada e com a qual concordam; aqui, a coordenação estabelece-se ao nível dos serviços;
2 - coordenação por comissões interministeriais: em certos casos, a coordenação entre serviços de ministérios diferentes exige mecanismos permanentes de concertação; surgem assim as comissões interministeriais;
3 - coordenação por acordo entre os Ministros competentes: é frequente que não haja acordo entre os serviços dos ministérios ou nas comissões interministeriais: os serviços têm muitas vezes uma certa parcialidade, tendo de se recorrer aos Ministros;
4 - coordenação por um Vice-Primeiro-Ministro ou equivalente (Ministro de Estado, Ministro sem pasta);
5 - coordenação pelo Primeiro-Ministro: aqui verifica-se a intervenção formal do Primeiro-Ministro, que tem a responsabilidade constitucional de coordenar o Governo;
6 - coordenação pelo Conselho de Ministros: o Primeiro-Ministro, porque assim o entende ou porque algum Ministro lho solicita, pode levar um assunto a Conselho de Ministros;
7 - coordenação por Conselho de Ministros especializados: aí são levados e tratados os assuntos de natureza predominante técnica, que não convenha ser um órgão eminentemente político (como o Conselho de Ministros plenário) a decidir.

Porém, nenhuma destas hipóteses se confunde com o Conselho de Ministros. Este delibera quando a lei impõe e não só quando a matéria é complexa e os decisores competentes decidem pedir-lhe que delibere. Tem competências próprias e pode-lhe ser pedido, para além disso, que oriente um membro do Governo na sua decisão ou que os coordene num processo decisório conjunto. Isto, porém, não o reduz, no que toca às suas competências administrativas, a uma forma de coordenação ministerial, embora esse papel também lhe possa caber.

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