quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Princípio da Legalidade


1.Noções

   A Constituição da República Portuguesa, no nº2 do seu artigo 2º, consagra o princípio da subordinação do Estado à Constituição e estabelece como fundamento do próprio Estado a legalidade democrática.

   A expressão “legalidade democrática” implica que os órgãos e agentes administrativos estejam “subordinados à Constituição e à lei” (nº2 do artigo 266º da Constituição) e que na “prossecução do interesse público”, visado pela Administração Pública, esses órgãos e agentes ajam de acordo e “no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos” (nº1 do mesmo artigo).

   Na sequência destas normas constitucionais, o nº1 do artigo 3º do Código do Procedimento Administrativo estabelece o seguinte:

“Os órgãos da Administração Pública devem actuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes foram conferidos”

   Segundo o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 30 de Junho, de 1977 (Sérvulo Correia, Noções de Direito Administrativo, I, Editorial Danúbio, Lda, 1982, págs.234 e 235), “… este princípio, que constitui um princípio fundamental da nossa ordem jurídica e emerge do próprio conceito de Estado-de-Direito parece abranger, para além do respeito das normas jurídicas, o das vinculações resultantes das manifestações de vontade destinadas à produção de efeitos em casos concretos, até porque as mesmas, precisamente por aquele primeiro aspecto, têm de se conformar com as normas jurídicas, daí, que a vinculação no citado segundo aspecto se possa basear, afinal na vinculação a que se refere o primeiro.”

   A submissão à lei da Administração Pública abrange, portanto, todos os actos normativos considerados como lei em sentido genérico e material, tais como lei da Assembleia da República, decretos-leis do Governo, decretos regionais e regulamentos administrativos. Ou seja: a regra geral de actuação da Administração Pública é o da “reserva legal”, a qual abrange o respeito das normas jurídicas pelos órgãos e agentes da Administração quando chamados a intervir em casos concretos (os actos administrativos, por exemplo, que as desrespeitem são inválidos). Mas um segundo aspecto podemos ainda considerar, isto é, a administração pública deve também respeitar os próprios actos administrativos que profere e também os contratos administrativos que celebra. Ao respeitá-los está ainda a observar, de forma mediata, o princípio da legalidade.

   O princípio da legalidade consiste, por conseguinte, na chamada “reserva legal”, segundo a qual “os órgãos e os agentes da Administração Pública só podem agir com fundamento na lei e dentro dos limites por ela impostos (Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, II, Almedina, 2ªed., pág.50).

   Como o mesmo autor acrescenta (págs. 50 e 51), trata-se de uma definição que se distingue da do Professor Marcello Caetano (“nenhum órgão ou agente da Administração Pública tem a faculdade de praticar actos que possam contender com interesses alheios senão em virtude de uma norma geral anterior”) por três aspectos:

-Formulação positiva (diz o que a Administração deve fazer e não o que está impedida de fazer);

-Extensão (abrange toda a actividade administrativa e não apenas aquela que pode lesar os direitos e interesses dos particulares);

-Princípio da competência (a Administração só pode fazer aquilo que a lei permite e não tudo aquilo que a lei não proíbe, como sucede no Direito privado, em que vigora o princípio da liberdade).

 

2.Conteúdo

 

   Completando um pouco mais o que se referiu no ponto anterior, o princípio da legalidade abrange todo o “bloco legal” (na expressão de Hauriou), a saber:

-A Constituição;

-A lei, em sentido formal e em sentido material;

-O regulamento;

-Os direitos resultantes de contrato administrativo e de direito privado;

-Os direitos resultantes de acto administrativo constitutivo (de direitos);

-Os princípios gerais de Direito;

-O Direito Internacional que vigore na ordem interna.

   Como salienta o Professor Freitas do Amaral (obr.cit.,pág.58), “a violação, por parte da Administração Pública, de qualquer destas sete categorias de normas ou actos implica a violação da legalidade (hoc sensu) e constitui, por conseguinte, ilegalidade”.

 

3.Objecto

 

   O princípio da legalidade abarca regulamentos, actos administrativos, contratos administrativos, contratos de direito privado e simples factos jurídicos (todos têm de respeitar a lei – princípio da prevalência ou da preferência).

   Qualquer violação da legalidade no exercício destas formas de actuação administrativa gera ilicitude com as consequências jurídicas dela decorrentes, tais como a invalidade e a responsabilidade civil (princípio da prevalência ou da reserva de lei).

 

4.Preterição do princípio da legalidade

 

   O nº2 do artigo 3º do Código do Procedimento Administrativo dispõe que se justifica a preterição das regras abrangidas pelo princípio da legalidade, quando se verifique estado de necessidade. Assim, são justificados os actos praticados, quando se verifique um perigo iminente e actual, para cuja produção não haja concorrido a vontade do órgão, que suscite uma tal colisão de interesses que leve a Administração a agir com preterição dessas regras, para evitar um mal maior.

   Trata-se de situações de necessidade pública (estado de guerra, estado de sítio, grave calamidade natural). Nestes casos a Administração Pública fica dispensada “de seguir o processo legal estabelecido para circunstâncias normais e pode agir sem forma de processo, mesmo que isso implique o sacrifício de direitos ou interesses dos particulares” (Freitas do Amaral, obr.cit., pág.61).

   Posteriormente, é obrigada a indemnizar os particulares dos prejuízos causados.

 

 

 

Sofia Pires,

Nº20822

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